Horas de viagem, banheiro feminino, religião e alunos adotivos.

Hoje mais uma vez, meu dia foi na correria. Primeiro que não é fácil administrar um blog que pode causar polêmicas, e segundo que não é tão simples chegar na escola onde eu trabalho, e nem na universidade.

Essa é mais uma das contas que já coloquei no papel: eu gasto quase três horas por dia dentro de ônibus. Parece coisa de metrópole, mas eu gasto uma hora de casa pra escola onde trabalho; cinqüenta minutos da escola até a faculdade, e mais cinqüenta minutos da universidade para casa. Total: duas horas e quarenta minutos por dia gastas dentro de ônibus. Não vou me gabar, mas funcionário efetivo tem direito de escolher a escola que quer trabalhar. No meu caso não foi bem assim que aconteceu. Eles (os diretores da secretaria de educação do estado de Sergipe) me jogaram pra uma escola que fica a uma hora de ônibus da minha casa. Fiquei puto! Aqui perto da minha casa, só de escolas estaduais tem umas oito! Oito escolas estaduais, e nenhuma delas tinha uma vaga sobrando pra mim? Ponto para o governador do estado Marcelo Merda. Se eu já não votava nele, agora é que eu não voto mais!

E pela divisão de tarefas, eu sou o responsável pela limpeza dos banheiros. Os banheiros dos meninos eu até lavo de boa, sem me preocupar tanto com as merdas que eles cagam. Já o banheiro das meninas... Meu Deus! Sinceramente, eu não considero aquilo como uma limpeza. Aquilo pra mim, que sou católico, eu consideraria como um exorcismo. Eu entro no banheiro e a primeira coisa que me vem à mente é: Puta que pariu! Como um banheiro feminino pode ser mais podre que o masculino? De imediato me vem essa resposta: O governo deveria proibir alguns casais de terem filhos. Se for pra não dar nem que seja o mínimo de educação, pra que reproduzir? Os meninos que estudam no turno da manhã, sinceramente, não passam de animais mal-adestrados.

Então começa o processo: encho o banheiro de água, passo o rodo nas pegadas de barro e amoleço toda a areia grudada no piso. Depois coloco água num vaso sanitário desse mesmo banheiro, cuja descarga está quebrada. Espalho a água por todo o banheiro, pra que ela alcance o mijo das meninas espalhado no chão. Depois começo a espalhar água sanitária por todo o banheiro, como se estivesse jogando água benta e sal grosso numa casa cheia de energias negativas. Por último, repito o processo da água sanitária, só que dessa vez com o desinfetante, e começo a puxar a água pra fora do banheiro, já que os ralos dele estão entupidos. Essa limpeza total dura de 20 a 25 minutos. O resultado é de encher os olhos: o banheiro com cara de banheiro de rodoviária, desses que você paga pra usar. Se eu fosse cobrar pras meninas usarem o banheiro, meu salário duplicava. Até que não é má idéia, mas a escola é pública e não demora muito pra aparecer alguma rede televisiva por lá.

Quando estava lavando o banheiro feminino, me veio um momento de reflexão. Imaginei aquele banheiro como se fosse eu. Quantas vezes me permiti que as pessoas usassem à vontade e sujassem de todas as maneiras? Nossa... Foram muitas! Isso sem contar às vezes em que eu mesmo me enchi de merda. Mas o que me fez mesmo parar pra refletir, foi que em nenhum momento de minha vida, ninguém veio me ajudar com a minha limpeza interior. Tive de fazer tudo sozinho. Mesmo com minhas crenças, tem certas coisas que tenho de fazer sozinho, e minha limpeza interior é uma delas.

Fico nesse momento imaginando o quanto as pessoas são acomodadas e esperam que alguém venha fazer uma limpeza em suas vidas, quando o que elas esquecem de fazer é começar por elas mesmas. É lamentável ver o quanto as pessoas ficam fanáticas religiosamente, acreditando que aquela religião foi a que a fez mudar de pensamento, mudar de atitudes, enfim, fez a sua limpeza interior. E no entanto, o que devemos fazer é ter a atitude de começar por nós mesmos. Mas como dizia Senge: "As pessoas não resistem à mudanças, elas resistem a ser mudadas." Uma dica que deixo aqui para as futuras gerações, e que já não é tão nova assim, é a de que a sua fé é dividida em três níveis: você deve acreditar em Deus, acreditar em você mesmo, para depois acreditar nas pessoas. Fazendo isso, você vai se dar bem, até mesmo sem ter religião nenhuma.

Mas mudando de seis pra meia dúzia. Não posso deixar de falar dessa juventude perdida. Na escola, é comum os alunos se identificarem com a gente. Mas tem certos casos em que é inevitável não adotarmos alguns. E na escola foram eles que me adotaram. Eu tenho acho que uns oito alunos que não passam um dia sem vir falar comigo, ou sentar pra ouvir o pouco que tenho pra dizer.

Posso citar o Cliver, um aluno de 16 anos que cursa o oitavo ano. Ele é fã de Michael e acreditem: Justin Bieber. O garoto sabe de cor quase todas as músicas do Michael, e algumas do Justin. Isso sem contar que ele sabe dançar todos os passos de Michael. E canta as músicas em Inglês de ouvido, sem pegar nas letras pra aprender. Ele começou a trocar idéia comigo porque eu manjo um pouquinho de inglês.

Outra aluna que merece ser citada é a Ana Claudia, ou a Cacau, como gosta de ser chamada. Aluna do sétimo ano, tem quinze anos e é casada com um rapaz de vinte. Ela é novata na escola e desde a primeira semana que vem sempre conversar comigo. Vejo que ela apesar de casada é bem sozinha, pois quando ela vem até mim, ela fica sem vontade de ir e desabafa quase sempre algum problema ou fala do dia a dia dela.

Tem ainda Andreza e sua gangue: um grupo de seis meninas de salas diferentes. Parecem que moram na mesma rua, pois mesmo de salas distintas, andam sempre juntas. Essas daí são as mais apimentadas da escola. Mas apesar das brincadeiras exageradas, são pessoas boas.

Fico por aqui mais uma vez, pois o horário não me permite que demore muito. Espero que gostem da postagem.